Conselho de Ética emite nota sobre decisões do STF

Ontem à noite, o Conselho de Ética decidiu enviar uma nota aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar aplacar os ânimos exaltados entre o Legislativo e o Judiciário em torno do pedido de cassação do deputado José Dirceu (PT-SP). Na nota, o colegiado tenta convencer o STF de que agiu corretamente no processo do ex-ministro da Casa Civil.

Assinada pelo presidente do conselho, deputado Ricardo Izar (PTB-SP), o texto rebate duas alegações que constam do mandado de segurança apresentado pela defesa de Dirceu ao STF: a de que as testemunhas de defesa foram ouvidas antes das de acusação, não permitindo o direito ao contraditório e a que o relatório usou provas que já foram consideradas ilícitas pelo ministro Eros Grau.

Nota de esclarecimento do Conselho de Ética:

Aguarda-se ansiosamente o deslinde de um julgamento na excelsa corte do país, o Supremo Tribunal Federal, cujo veredito produzirá repercussão direta sobre os trabalhos em curso na Câmara dos Deputados.

O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, tendo em vista a argumentação utilizada - e em algumas instâncias, aceita pelos egrégios ministros do Supremo Tribunal Federal no processo de cassação de mandato instaurado contra o deputado José Dirceu -, entende que alguns detalhes de extrema relevância relacionados ao funcionamento e à rotina do Conselho de Ética não estão sendo levados em conta.

Em primeiro lugar, devemos considerar a primeira e mais relevante distinção: enquanto um tribunal julga crimes segundo ritos preordenados e imutáveis, o Conselho de Ética é um tribunal político, de encaminhamento de causas políticas, onde o referendo final será dado não pelos 15 membros do Conselho, mas pelos 513 deputados federais - inclusive o acusado, com direito a voto -, reunidos especificamente com este fim.

Por outro lado, uma das alegações da defesa do deputado José Dirceu - a de que a inversão das oitivas das testemunhas teria ofendido o princípio do contraditório e da ampla defesa - não faz o menor sentido. O próprio ministro Marco Aurélio Mello afirma, em acórdão, referindo-se a processos criminais, que "se de um lado é certo que as testemunhas da acusação devem ser ouvidas antes das da defesa, de outro não menos correto é que a nulidade decorrente da inobservância desta ordem pressupõe prejuízo".

Há que se levar em conta, ainda, que num julgamento eminentemente político, como é o levado a cabo pelo Conselho de Ética - com o mais amplo e irrestrito direito à defesa, assegurado em todas as suas fases -, uma eventual inversão não causa prejuízo algum ao representado.

Considere-se que o Conselho de Ética não possui poderes para fazer convocações, seja de "testemunhas da defesa", seja de "testemunhas da relatoria". Na verdade, algumas dessas testemunhas têm sido erroneamente designadas como "testemunhas de acusação", quando o relator, na maior parte das vezes, deseja apenas ouvir outros ângulos da questão que não aqueles apresentados pelo acusado e as pessoas que ele designou para socorrer-lhe em sua defesa.

A partir desta flexibilidade relacionada com a participação de testemunhas inserida regimentalmente, não fica difícil inferir quão complicada pode se tornar a montagem de uma grade de depoimentos, onde o importante não é atender a uma norma do direito criminal, mesmo porque o julgamento é político, mas sim oferecer ao relator do processo um panorama amplo do caso, privilegiando o contraditório, para que ele possa, ao final, redigir seu relatório e proferir seu voto, a favor ou contra uma punição. E tudo isso dentro de exíguos 90 dias.

Um ponto importante nesse processo é que, ao final de cada instância, no Conselho de Ética e no Plenário da Câmara dos Deputados, o representado e/ou seus advogados são sempre convidados a falar, sendo lhes assegurada a última palavra. E assim continuará sendo em Plenário, quando houver novos julgamentos: os acusados terão, novamente, a chance de apresentar de maneira cabal e exaustiva os seus argumentos, antes que cada parlamentar deposite seu voto a favor ou contra uma cassação.

No caso específico do deputado José Dirceu, uma outra linha de argumentação sugere que teria havido uma eventual utilização de provas ilícitas por parte da relatoria, o que não é verdade mesmo porque boa parte delas se encontrava à disposição da opinião pública, fartamente noticiada pela imprensa. As informações prestadas pelo Conselho de Ética ao eminente ministro Eros Grau relacionadas com o possível uso de dados bancários sigilosos, e em especial as atitudes tomadas subseqüentemente pelo Conselho, dirimiram quaisquer dúvidas, suposições ou convicções de que pudesse haver contaminação do procedimento em questão. Um novo relatório foi apresentado, lido e votado, com resultado idêntico no Plenário do Conselho: 13 a 1.

Em processo sub-judice no STF, o ínclito ministro Ayres Britto, em seu relatório e voto, apreendeu - e com sabedoria externou - a profunda compreensão da dimensão complexa e singular da missão nobre, árdua e difícil deferida ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados.

É preciso compreender o papel, as funções, a missão deferida ao Conselho, em sua plena extensão e finalidade. No exercício da complexa singularidade de que se reveste a sua vocação finalística: a defesa da Ética e do Decoro, a defesa do nome, conceito e reputação da instituição, do Poder Legislativo, e dos mais sagrados valores da democracia representativa e do mandato parlamentar.

Os integrantes do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados consideram seu trabalho uma das tarefas mais árduas e constrangedoras. Mas não se furtam à busca da verdade com total transparência, rigor e senso de justiça. Acima de tudo, está o propósito de oferecer à sociedade uma resposta que possa dignificar cada um daqueles que representam os anseios do povo brasileiro por um País melhor e mais justo.

Brasília, 24 de novembro de 2005

Deputado Ricardo Izar
Presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar”

Comentários