Belo Monte é embargada por justiça federal de Altamira

Alailson Muniz
Da Redação

Uma liminar concedida, no último dia 28 de março, terça-feira, pelo juiz federal Antonio Carlos de Almeida Campelo, da vara única do município de Altamira, suspendeu o processo de licenciamento ambiental da hidrelétrica de Belo Monte, que a Eletronorte havia reiniciado no segundo semestre do ano passado.

O juiz aceitou o pedido do Ministério Público Federal (MPF) feito pelos Procuradores da República Marco Antonio Delfino de Almeida e Felício Pontes Jr. Eles argumentaram que o licenciamento não poderia começar sem consulta às comunidades indígenas afetadas pela construção da hidrelétrica.

Segundo o texto da Ação Civil Pública impetrada pela Procuradoria da República no Pará, pelo menos as reservas indígenas de Arara, Kararaho, Koatinemo, Paquiçamba e Trincheira Bacajá podem sofrer impactos de Belo Monte. Na petição, o MPF ainda alega que os “indígenas foram ignorados tanto pela Eletronorte, quanto pelos parlamentares brasileiros, quando editaram o Decreto Legislativo nº 788/2005, que autorizou os Estudos de Impacto Ambiental (EIA), depois de menos de 15 dias de tramitação na Câmara e no Senado”.

“A aprovação do decreto e o início do licenciamento afrontam à Constituição Federal, que prevê a oitiva das comunidades indígenas pelo Congresso antes de aprovação de empreendimento hidrelétrico”, disse a imprensa o procurador Felício Pontes Jr..

O juiz Antonio Campelo determina em sua decisão a "suspensão de qualquer procedimento empreendido pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) e pela Eletronorte para a condução do licenciamento da Usina Hidrelétrica de Belo Monte".

O inicio da elaboração do Termo de Referência da obra que seria firmado com os municípios da Transamazônica também foi afetado pela liminar. A multa determinada em caso de descumprimento da decisão é de um milhão de reais.

O juiz de Altamira entendeu que os riscos ambientais do projeto justificam a liminar. "A interrupção do curso do rio Xingu afetará a viabilidade de locomoção no mesmo, diminuirá a oferta de peixes, principal fonte alimentar das comunidades indígenas, facilitará a proliferação de doenças que podem culminar em processo de dizimação de comunidades indígenas, mudará o regime de vazões, a qualidade da água, a composição da fauna aquática, reduzirá a fertilidade natural das várzeas e aumentará a erosão das margens, não se justificando qualquer retardo", diz a liminar.


Ele diz ainda que em sua decisão "não estão em salvaguarda apenas o meio ambiente e direitos de comunidades indígenas, mas também questões que refletem na sociedade, na economia e na cultura das populações envolvidas e principalmente das gerações futuras, que merecem receber um meio ambiente ecologicamente equilibrado de seus antepassados".


Belo Monte: demanda judicial já é antiga
Belo Monte é objeto de disputa judicial desde o ano de 2001, quando o mesmo MPF ajuizou a primeira Ação Civil Pública contra o licenciamento da usina, justamente pela ausência de decreto legislativo autorizando o processo. Depois de sucessivas derrotas judiciais, a empresa voltou a insistir na obra no ano passado, depois da aprovação do Decreto Legislativo nº 788, que sanaria, em tese, as falhas apontadas pela Procuradoria da República.

Na análise do decreto, no entanto, o MPF descobriu novas falhas: a pressa em aprovar o empreendimento fez os parlamentares ignorarem a necessidade de audiências com as comunidades indígenas. O questionamento foi apresentado pelo procurador-geral da República ao Supremo Tribunal Federal através de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI). Os ministros, no final de 2005, julgaram que o instrumento jurídico escolhido não era o correto e o decreto foi mantido por uma questão processual, sem análise do mérito. Dias depois, a Eletronorte solicitou ao Ibama o início do licenciamento.

Em março de 2006, novo pedido do MPF voltou a ser apresentado à justiça, dessa vez na forma de nova Ação Civil Pública, outra vez vitoriosa. "A construção da usina hidrelétrica de Belo Monte nas condições jurídicas atuais equivale à edificação de um monumento ao desrespeito à Constituição", afirmaram os procuradores na ação agora acolhida pela Justiça Federal.

O Greenpeace chegou a se pronunciar sobre o assunto dizendo que "essa é uma vitória para a Amazônia, para o rio Xingu e para o seu povo, que desde a década de 80 vem lutando contra a instalação de usinas hidrelétricas na região. Belo Monte, além de inundar mais de 40.000 hectares de florestas, afetar diretamente diversos povos indígenas, modificar profundamente a dinâmica do rio Xingu e emitir imensas quantidades de gases de efeito estufa, não iria gerar energia para beneficiar as populações locais. Sua energia teria como destino principal a indústria de mineração, que também provoca imensos danos à floresta e aos rios. Seria um completo absurdo."

"É necessário que haja a autorização dos estudos já que eles custam caro e dependem de dinheiro público. Se o Congresso descobrir, depois de autorizados os estudos, que não deveria ter realizado a obra porque o custo de remoção de povos indígenas seria grave para o Brasil e o beneficio não seria superior, muito dinheiro público já terá sido jogado fora".

Na última quinta-feira (30), o diretor de Licenciamento e Qualidade Ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Luiz Felippe Kunz Junior, disse ao programa Nossa Terra, da Rádio Nacional da Amazônia, que a medida liminar impediu o Ibama e as Centrais Elétricas do Norte do Brasil (Eletronorte) de realizarem qualquer atividade relacionada ao empreendimento, inclusive as reuniões marcadas com as comunidades da região para discutirem os impactos dessa construção.

Ele informou que o Ibama vai entrar com uma ação judicial para sair da condição de réu do processo. De acordo com o diretor, o objetivo das reuniões que estavam marcadas para os dias 30 e 31 era ouvir os habitantes da região antes de estabelecer o estudo de impacto ambiental (EIA).

"Não existe nenhum risco de dano ambiental imediato ou de início de construção", enfatizou. Kunz Junior explicou que essa primeira fase de encontros não é obrigatória. Depois que os estudos estiverem prontos, serão feitas as audiências públicas.

Pontes esclareceu que o Ministério Público Federal entrou com ação contra o decreto legislativo 788/2005. E que, apesar de o Ibama não ter cometido a ilegalidade, ele é o órgão responsável pelo licenciamento e, por isso, o réu da ação.

"Um projeto desses tem de ser analisado; é uma decisão grave já que pode matar etnias inteiras no Vale do Xingu".

Segundo o procurador, há estudos das universidades do Pará e de Campinas (Unicamp) que mostram que a energia a ser gerada pela usina será menor do que a previsão.

"Alguns especialistas afirmam que os impactos ambientais para a construção da Usina de Belo Monte são tão fortes, como mudanças no curso do rio e o desaparecimento de peixes, que também acabarão inviabilizando economicamente a obra".

Para ele, o Brasil está na contramão do primeiro mundo na busca de energia. "Enquanto esses países buscam fontes alternativas de energia para a produção, nós estamos pensando em obter energia vinda dessas usinas hidrelétricas, que têm alto custo financeiro e ambiental".

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