Senador critica avanço da soja no Pará

José Nery é contra o agronegócio por causa dos danos ao meio ambiente
Alailson Muniz
Agência Amazônia
O senador da república José Nery (PSol-Pa) esteve em Santarém onde concedeu entrevista e falou de questões importantes para a região do oeste paraense como a tentativa de desenvolver a economia local através da monocultura de soja, a polêmica da não ativação do Hospital Regional, trabalho escravo e o crescimento de seu partido na região.
O senador abaetubense (Nery) é membro da Comissão de Direitos Humanos do Senado e presidente da Subcomissão de Combate ao Trabalho Escravo. Ele desembarcou em Santarém no final de semana para participar da II conferência municipal de educação e do encontro regional preparatório à primeira Conferência de Direitos Humanos, organizado pela Secretaria Executiva de Justiça e Direitos Humanos.
Nery chegou ao senado graças à eleição de Ana Júlia para o governo do Estado e tem mandato até 2011. Ele também é o único representante do PSol no senado. Para ele, o atual modelo de desenvolvimento que está sendo proposto para região Oeste do Pará é concentrador, desigual, degrada o meio ambiente e não vai desenvolver a região. No final da entrevista, o senador diz que Lula está perdido e ainda nem começou a governar em seu segundo mandato. A seguir a entrevista.
O senhor acha que a monocultura da soja é o modelo ideal de desenvolvimento para a região oeste do Pará?
NERY (PSOL): A minha concepção de desenvolvimento está relacionada a pensar que toda a atividade econômica desenvolvida em uma determinada região deve está a serviço dos interesses da população da região. Eu vejo que esses empreendimentos ligados ao agronegócio ocupam extensas áreas de terra, empregam pouca gente e sobra muito pouco para os trabalhadores da região. Ainda, leva à concentração da terra, degrada o meio ambiente e agrava as condições sociais da população nativa. A meu ver é um modelo que não serve aos interres do povo mais pobre da região. Nosso posicionamento é um posicionamento crítico a esse modelo. E acho que os movimentos sociais e poder o público têm de buscar um modelo que eleve em conta os anseios da população da região. O modelo agro-exportador não serve ao povo dessa região.
O senhor acha que a prefeitura de Santarém devia tomar um posicionamento sobre o imbróglio Cargill?
NERY (PSOL): Primeiro que a construção do terminal não levou em conta a legislação do país, além de outras situações. Eu considero que os movimentos sociais e a sociedade civil organizada devem cobrar do poder público um posicionamento. Porque envolve interesses sociais, econômicos e ambientais da região. A meu ver o posicionamento mais correto é aquele que se aliar com aqueles que debatem um modelo que realmente traga benefícios para a população.
Como o senhor avalia a problemática que está girando em torno do Hospital Regional Público do Oeste que ainda não está funcionando?
NERY (PSOL): Esse hospital foi concluído no final do governo passado sem alguns equipamentos. Juntamente com outros quatro, foram feitos a pressas e sem funcionar. Inclusive, o modelo de gestão deveria ser público e não de uma organização social, o que configura privatização da gestão pública na saúde. Nós sabemos que o estado tem de garantir a saúde da população. O governo da Ana Júlia tem de ter o compromisso de fazer isso funcionar. A população tem de exigir, mas ao mesmo tempo o governo tucano que entregou , fez propaganda, enganou o povo e isso tem de ficar claro. Agora, independente disso o povo precisa de saúde.
O Pará é o primeiro no ranking do trabalho escravo. O que o senado está fazendo para reverte essa situação?
NERY (PSOL): O Pará continua sendo campeão de trabalho escravo, mas é realidade em outros estados também. Na Comissão de Direitos Humanos do senado o assunto foi criada a subcomissão de Combate ao Trabalho Escravo a qual eu presido, e tem dez senadores. Em reunião realizada semana passada, nós definimos o cronograma de trabalho para fazer avançar a luta pela erradicação do trabalho escravo no Brasil. Nós definimos um conjunto de visitas nas regiões onde há maior incidência de trabalho escravo. Os primeiros estados a serem visitados serão Pará, Maranhão e Tocantins. Também vamos falar com os trabalhadores e suas lideranças. Vamos acompanhar as ações do governo federal junto ao Ministério do Trabalho para avaliar o cumprimento das metas do plano nacional de erradicação do trabalho escravo elaborado em 2003. E vamos trabalhar do ponto de vista legislativo para aprovar projeto de lei que é de fundamental importância no combate ao trabalho escravo. Trata-se da PEC/438, que há 10 anos tramita no Congresso e já foi votada em dois turnos no senado e aprovada. Os setores mais conservadores do campo fazem frente para impedir a aprovação desta PEC, porque ela expropria toda propriedade que utilize o trabalho escravo e a coloca a serviço da Reforma Agrária, inibindo a prática.
█ O que favorece o avanço do trabalho escravo no Pará?
NERY (PSOL): Primeiro nossa vasta extensão territorial. Onde tem muitas fazendas distantes dos grandes centros. Isso facilita o aliciamento em outros Estados, como Maranhão e Piauí. Também, há uma falta de esclarecimento sobre o direito dos trabalhadores. Uma campanha que precisa ser feita de forma mais ampla quanto estas armadilhas que são feitas pelos aliciadores ou populares “gatos”, que prometem um conjunto de condições para escravizar com o emprego da violência.
Santarém possui apenas um fiscal para mais de 23 municípios. Falta investimento por parte do governo federal?
NERY (PSOL): Para ser justo, de 2003 pra cá, foi o período de nossa história onde mais se combateu o trabalho escravo e onde houve maior número de libertações de trabalho escravo. Mas a dura realidade é que falta estrutura e recursos humanos e falta até transporte como é o caso aqui de Santarém. Isso também influencia no crescimento do trabalho escravo. A nossa comissão está fazendo um amplo levantamento no âmbito dessa situação para pressionar e discutir, durante o orçamento, um volume maior de recursos para o combate ao trabalho escravo.
█ Como está a relação do Psol com o PT em Brasília?
NERY (PSOL): Nós defendemos um programa de mudanças e isso nos faz um partido de oposição. Mas, o nosso posicionamento é delicado. Temos de nos diferenciar da oposição de direita e de alguns setores do governo. A votação dos transgênicos, por exemplo, o PSol votou contra a comercialização de milho transgênicos e foi acompanhado de setores do PC do B, do PT e do PPS.
Qual a sua avaliação da participação da bancada paraense no senado?
NERY (PSOL): As questões que estão nos mobilizando estão se referindo a mudanças na vida de nosso povo, como a defesa da Reforma Agrária e do fortalecimento de programas sociais que se direcionem recursos a população mais pobre e contra os parcos recursos direcionados para a região. São dois senadores do PSDB e um do PSol. Em alguns eixos possamos, em nome do Pará, fazer a defesa de forma conjunta. Agora, as visões de políticas são bem diferenciadas. Mas, o Para deve está cima da questão partidária.
A Ação Popular Socialista (APS), corrente do Psol da qual o senhor participa, vai deixar o partido voltar para o PT?
NERY (PSOL): Eu desconheço esse convite. Oficialmente essa questão não existe. Não cabe especular em cima de boatos. Desconheço qualquer debate que leve a essa redefinição de rumos. E garanto que se existisse eu estaria sabendo.
O modelo que Lula propõe para desenvolver a região amazônica através do PAC é válido? Vai sair as rodovias Santarém-Cuiabá e Transamazônica?
NERY (PSOL): Em relação ao segundo mandato do governo Lula, parece que ele nem começou. O PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) até agora tem sido composto de muita propaganda e pouca realização. As medidas estão em discussão no Congresso e algumas já aprovadas na Câmara. Algumas medidas que constam no PAC são necessárias. Como a melhorias das estradas. Essas são obras que já foram instaladas e postas. É importante para o Pará. Entretanto, algumas obras de energia hidrelétrica (Belo Monte) têm de ser repensadas. Algumas são desrespeitos a populações indígenas e beneficiam apenas alguns. E perpetuam esse modelo posto e por isso somos contra. Até é compreensível que essas populações isoladas há séculos achem que vai trazer desenvolvimento, mas a prática mostra o contrário, vide o caso de Tucuruí. Aqueles que migraram por causa do projeto hoje estão em situações desumanas. Isso gerou conflito dentro do próprio governo que racha em torno da questão.

Comentários

Anônimo disse…
Muito bom o posicionamento do senador a respeito do modelo de desenvolvimento da soja para a Amazônia.

Pedro Siqueira